A cozinha é o lugar mais reconfortante da casa porque nele encontramos alimento para o corpo e para a alma. Deixe a Natureza entrar na sua e esqueça os produtos feitos pela indústria alimentícia em geral, que não coloca amor nesse ato nem está preocupada com a saúde do seu organismo e o de sua família!

Esse é um dos segredos de manter o bem-estar - não entregue essa função vital a terceiros - ponha a mão na massa, deixe a preguiça de lado e estabeleça como prioridade fazer a comida que vai mantê-lo longe das doenças!

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Paul Newman, orangotangos e óleo de palma


Essa combinação parece letra de "samba do crioulo doido", mas, absurdamente, tem sentido.
Paul Newman (um dos meus atores preferidos, desencarnado em 2008), os orangotangos e a gordura trans relacionam-se nesse artigo do New York Times, publicado em 12/04/2006 e intitulado "Nos EUA, óleo de palma é alvo dos ecologistas".
Já comentamos no blog os problemas causados pelo uso do óleo de palma na alimentação, supostamente nos livrando dos males da gordrura trans. Vamos aprofundar o assunto, através da leitura desse texto, cujo autor é Kim Severson.

"Tudo começou de forma muito simples, com a indústria de alimentos explorando o óleo de palma como uma alternativa à gordura transversa.

Agora, Paul Newman está zangado, orangotangos estão morrendo e pode ser que os biscoitos recheados nunca mais sejam os mesmos.

A protagonista - se é que uma história sobre gordura dietética pode ter uma protagonista - é Nell Newman, filha do ator Paul Newman. Em 1993, ela falou com o pai sobre a criação de uma pequena linha de produtos orgânicos como parte da sua companhia de alimentos, a Newman's Own, cujos lucros são dirigidos às instituições de caridade. Nell o convenceu a implementar a idéia ao fazer para ele um jantar de Dia de Ação de Graças usando apenas ingredientes orgânicos.

Assim como outras companhias que produzem maciçamente alimentos como biscoitos e crackers, a Newman's Own Organics desejava encontrar uma forma de evitar o uso da gordura transversa, um ácido graxo criado artificialmente e encontrado naquilo que várias cozinheiras domésticas chamam de "shortening" ("margarina culinária").

Também conhecida como óleo parcialmente hidrogenado, a gordura transversa é considerada a pior gordura na dieta norte-americana. Ela não só eleva o nível do mau colesterol, mas acredita-se também que reduza a taxa do bom colesterol. As Diretrizes Dietéticas de 2005 do Departamento de Agricultura sugerem que se coma a menor quantidade possível de gorduras transversas, e neste ano o governo federal obrigou as fabricantes de alimentos a incluírem as quantidades de gordura transversa nos seus rótulos de informação nutricional.

A Newman's Own Organics usa óleo de palma, uma gordura dietética que também está cercada de controvérsias. O fruto da palma tem o tamanho aproximado de uma ameixa, e quando a sua polpa (mesocarpo) é esmagada, obtêm-se um óleo que é cerca de 50% saturado.

O óleo de palmiste (a amêndoa do fruto da palmeira) também é utilizado para a fabricação do óleo, que é extraído por um processo químico. Ele possui um conteúdo bem mais elevado de óleo saturado, mas não tão alto quanto o do óleo de coco, que é quase que totalmente saturado.

Para as pessoas que não têm ouvido os seus médicos ultimamente, uma quantidade excessiva de gordura saturada pode causar doenças cardíacas. E este é um dos motivos pelos quais o Centro de Ciência no Interesse Público, um grupo de defesa da alimentação saudável, lançou uma campanha contra o óleo de palma.

O diretor-executivo do grupo, Michael Jacobson, disse que há o temor de que a indústria de alimentos substitua o óleo parcialmente hidrogenado pelo óleo de palma, uma gordura que não é tão ruim, mas que ainda contribui para as doenças do coração.

Até o momento, a quantidade de óleo de palma no suprimento norte-americano de alimentos é trivial quando comparado à de óleo de soja e de canola.

"Quero deixar as coisas deste jeito", disse Jacobson. Mas a quantidade de óleo de palma que os Estados Unidos estão importando do sudeste da Ásia, de onde vem a maior parte deste produto, continua aumentando. As importações saltaram de 195 mil toneladas em 2003 para 405 mil toneladas em 2005, segundo estatísticas do Serviço de Agricultura Estrangeira do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA).

É aqui que entram os orangotangos. No verão passado, o Centro de Ciência no Interesse Público divulgou um relatório chamado "Óleo Cruel". Nele, o grupo afirma que trechos cruciais de floresta tropical estão sendo destruídos e transformados em plantações de palmeiras na Malásia e na Indonésia, que respondem por mais de 80% da produção mundial de óleo de palma. Os orangotangos vivem em Sumatra e em Bornéo, e a campanha sustenta que estes primatas e outros animais ameaçados, incluindo tigres e rinocerontes, estão correndo o risco de "morrer por causa de um biscoito".

E é aqui que entra Paul Newman. Jacobson e outros autores do relatório acusam Paul Newman de "se gabar" nos seus rótulos de biscoitos e pipoca de microondas de que o óleo de palma não contém gordura transversa, e que ele é menos saturado do que o óleo de palmiste.

"Essas declarações são literalmente verdadeiras, mas elas enganam as pessoas, ao fazer com que pensem que o óleo de palma é totalmente saudável", diz o relatório. "O óleo de palma não é um alimento saudável".

Para Nell Newman, que investiu bastante tempo e dinheiro na agricultura sustentável e outras causas ambientais, o ataque contra a companhia da sua família parece ser injusto. O seu pai ficou ainda mais furioso.

"Isso realmente aborreceu papai", declarou Nell Newman. Ele ficou obcecado por provar que o tipo de óleo de palma usado pela companhia é uma alternativa saudável às gorduras transversas, e que a Newman's Own Organics não está enganando os seus clientes.

A companhia utiliza o óleo de palma de árvores cultivadas organicamente na Colômbia, que não possui orangotangos, explica Neil Blomquist, ex-diretor-executivo e ex-presidente da Spectrum Organic Products, que vende óleo de palma para a Newman's Own. Segundo Blomquist, o óleo da companhia é obtido por meio de práticas ainda mais criteriosas do que aquelas sugeridas pela Conferência do Óleo de Palma Sustentável, um grupo que inclui plantadores, processadores e ambientalistas.

Ele disse que algumas das plantações são cultivadas como parte dos esforços do governo dos Estados Unidos no sentido de fornecer aos agricultores uma alternativa à cultura da coca. Blomquist, que atualmente presta serviços de consultoria ao Grupo Hain Celestial, que comprou a Spectrum, visitou os campos de plantações de palmeiras na Colômbia.

Assim como vários nutricionistas e vendedores do setor de alimentos saudáveis, Blomquist acredita que o óleo do fruto da palma e o tipo de gordura saturada que ele contém sejam mais saudáveis do que as gorduras saturadas derivadas das carnes de boi e de porco.

"Esse produto é uma fonte excelente daquilo que eu chamaria de um óleo minimamente neutro, mas eu creio que ele proporciona também alguns benefícios para a saúde", opinou Blomquist.

Quando se trata da ciência das gorduras dietéticas, determinar o que e quando comer é algo como praticar tiro contra um alvo móvel. Continuam em andamento as pesquisas para determinar quais gorduras são benéficas e quais se constituem em uma rota rápida para um ataque cardíaco. E, conforme ficou demonstrado com a guinada que o Centro de Ciência no Interesse Público e outros órgãos tiveram que dar com relação às gorduras transversas e à margarina, que já foram tidas como alternativas saudáveis à manteiga, a ciência às vezes erra.

O médico Walter Willett, diretor do Departamento de Nutrição da Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard, disse que optaria pelo óleo de palma, e não pelas gorduras reversas, caso usasse a receita de um prato que necessitasse de um pouco de gordura densa.

"Se o indivíduo for cuidadoso, não há necessidade de usar muito, e em tal caso o óleo de palma é a melhor escolha", disse ele. "Várias gorduras saturadas não são totalmente ruins. Elas não são tão adversas quanto as pessoas acreditavam no passado".

Mesmo assim, ele encoraja a população a usar óleos líquidos como o de canola e o de oliva sempre que possível, e a limitar o uso geral de gorduras saturadas.

Algumas companhias que estão procurando encontrar uma gordura capaz de tolerar o abuso resultante da produção de alimentos em grande quantidade e, ao mesmo tempo, fornecer a textura característica das gorduras transversas, se voltaram para os óleos de canola ou de açafroa. Outras usam óleos líquidos que foram condensados por meio da hidrogenação total e, a seguir, amolecidos com mais óleo líquido. E algumas estão trabalhando com um processo chamado interesterificação, que envolve enzimas.

Na frente relativa ao óleo de palma, as coisas haviam se acalmado em torno da casa dos Newman até o mês passado, quando o grupo de Jacobson publicou um anúncio de página inteira no "The New York Times", que mostrava a foto de um bebê orangotango rodeado por crânios de orangotangos adultos. "A produção de óleo de palma está matando orangotangos", dizia o anúncio.

Para Nell Newman, cujo trabalho com os falcões peregrinos ameaçados fez com que ela ingressasse no universo dos produtos orgânicos, a conexão que estão fazendo entre os seus biscoitos e malefícios aos animais é algo de horrível. Mas os Newman não querem entrar novamente em uma polêmica com Jacobson.

"Quando não consegue o que deseja, ele simplesmente aumenta a aposta", critica Peter Meehan, que administra juntamente com Nell Newman o setor orgânico da companhia de alimentos.

Paul Newman, que passou meses lidando com essa questão, também não quer mais falar sobre o assunto.

"Ele não sabe o que poderia acrescentar a esta altura", disse Meehan.

O Conselho Malasiano de Promoção do Óleo de Palma também não está nem um pouco satisfeito com Jacobson. A instituição publicou um anúncio de meia página na terça-feira (11/04) no "The New York Times" contestando as afirmações de que a produção de óleo de palma destrói o meio-ambiente e promove doenças cardíacas.

Jacobson nega estar engajado em uma campanha pessoal contra os Newman e admite que o óleo de palma da ilustre família não está matando os orangotangos. Mas ele ainda critica os rótulos nutricionais.

Ele disse que os Newman usam uma linguagem nesses rótulos que faria o seu autor ser alvo de gargalhadas em uma escola de marketing: "Os rótulos podem passar no teste ambiental, mas não coma esses biscoitos se você realmente se preocupa com o seu coração".

A menos que você seja um dietetista ou goste de fazer contas antes das refeições, descobrir a quantidade de gordura saturada que está ingerindo pode ser um desafio. Não mais que 10% das calorias ingeridas diariamente devem ser provenientes de gorduras saturadas. Para as pessoas que ingerem 2.000 calorias diariamente, isso representa cerca de 22 gramas.

Imagine três marcas de biscoitos recheados feitos com gorduras saturadas provenientes de fontes diferentes. Para se ingerir a quantidade diária máxima recomendada de gorduras saturadas uma pessoa poderia comer 29 biscoitos recheados Newman-O's, feitos com óleo de palma. Caso a escolha fosse pelo Oreos, que contém óleos de canola e de palma, poder-se-ia comer 33 biscoitos. Mas se a pessoa preferisse os biscoitos recheados orgânicos que usam óleo de girassol em vez de óleo de palma, ela poderia comer 88 biscoitos Country Choice (mas é importante lembrar que isso representaria 5.720 calorias)."

Tradução: Danilo Fonseca

Particularmente, não comeria nenhum desses biscoitos...

E mais duas notícias breves, enfatizam que o óleo de palma não é uma boa escolha mesmo:

"A organização ecologista WWF/Adena (World Agriculture and the Environment), publicou recentemente um estudo onde aponta a agricultura como a maior atividade produtiva do mundo, mas também como uma das ameaças mais perigosas para o Planeta: a produção ineficiente de alimentos e as práticas culturais incorretas causam a desflorestamento, a escassez e a contaminação dos recursos hídricos.
(...) No seu estudo, o cientista aponta o óleo de palma como o produto que maior ameaça representa para os mamíferos em perigo de extinção, pelo fato de as plantações maciças daquele cultivo invadirem os habitats de animais como o elefante asiático, o rinoceronte da Sumatra, o orangotango e o tigre.
Segundo dados da WWF/Adena, a agricultura desperdiça 60 por cento dos 2500 bilhões de litros de água que emprega por ano, o que significa que em muitas zona da Terra os recursos hídricos estão a ser explorados para além dos seus limites."
(07/11/04)


"Os Amigos da Terra (Friends of the Earth) publicaram um relatório sobre o impacto da produção de óleo de palma. "Entre 1985 e 2000, o desenvolvimento das plantações de óleo de palma foi responsável por um desflorestamento na Malásia estimado em 87%. Em Sumatra e no Bornéu, cerca de 4 milhões de hectares de floresta foram convertidos em plantações de palmeiras. Agora está projetada a liquidação de mais 6 milhões de hectares na Malásia e outros 16,5 milhões na Indonésia. O orangotango provavelmente desaparecerá da floresta. Os rinocerontes, os tigres, os macacos probóscides, os tapires e milhares de outras espécies podem ter o mesmo destino. Milhares de indígenas foram expulsos das suas terras, e cerca de 500 indonésios foram torturados quando tentaram resistir. Toda a região está a ser transformada num gigantesco campo de óleo vegetal. Antes de serem plantadas as palmeiras, que são pequenas e baixas, muitas outras árvores de floresta, que contêm uma muito maior armazenagem de carbono, têm de ser abatidas e queimadas. Uma vez esgotadas as terras mais secas, as plantações estão a mover-se para as florestas de pântano, que crescem sobre turfa. Depois de terem cortado estas árvores, os agricultores drenam o solo. À medida que a turfa vai secando ela oxida-se, libertando ainda mais dióxido de carbono do que as árvores. Em termos de impacto quer no ambiente local quer no global, o biodiesel de palma é mais destrutivo que o petróleo bruto da Nigéria.
(26/3/07) Vemos aqui que o óleo de palma, além de alternativa para, pretensamente, eliminar a gordura trans dos produtos alimentícios, também está sendo cultivado para uso como combustível (biodiesel).

2 comentários:

Anônimo disse...

Gostei de sua linguagem, parabéns pelo blog , tem assuntos serios, densos mas mesmo assim transmite leveza.
Estou vivendo coflito no momento , que poucos entendem: tenho uma padaria artesanal orgânica e estou em processo de certificação,e há esse impasse, sou cntra o óeo de palma por todos esses motivos expostos, mas tão pouco conhecidos mesmo por algunnsque praticam alimentçãosaudável-e exigem ouso do tal oleo.
Uso o óleo de girassol, que na extraçã usam benzeno- mundo insano né?

Mas dentro do que pesquisei- teses e conversei com os autores das teses o óleo de girassol é ainda melhor...
Agora , quebrar esse "dogma" do simpático óleo de palma...estou quase desistindo
Boa sorte, espero que mais pessoas tenham a sorte de ter aceso à informçãoes importantes que voce traz aqui.
Sugestão:procure um livro , tecnico , de Universidade :"tecnologia de alimentos" de Luis Evangelista (talvez eu esteja enganada a respeito do primeiro nome: José?)e leia o capitulo sobre aditivos ,mas principalmente leia o comentario do proprio autor sobre os aditivos, é deprimente e preocupante de como a ciencia pode ser omissa em prol do lucro.

Vera Falcão disse...

Obrigada pelos elogios, são sempre estimulantes!
Então, "se correr o bicho pega, se ficar o bicho come" - essa metáfora parece estar cada vez mais descrevendo a situação que ocorre quando temos que optar por nossos alimentos (e outros itens) - a indústria tomou conta de praticamente tudo e fica difícil escolher sem ter que pesquisar exaustivamente...
Vou tentar acessar a tua recomendação bibliogáfica, porque é um tema que me interessa muito e há muitos anos, saber o que estão colocando na nossa comida, muitas vezes sem termos a menor ideia do que são esses ingredientes e porque eles estão lá!
Uma ótima referência também é o livro do dr. Marcio Bontempo, "RELATÓRIO ORION - Denúncia médica sobre os perigos dos alimentos industrializados e agrotóxicos" - ed. L&PM, tenho a 4ª edição publicada em 1986, mas certamente já deve existir uma atualização no mercado.

Um abraço e boa sorte no teu empreendimento!